BETO FREITAS

DECANTAÇÃO,2024 Instalação vidro, galões plásticos, água do lago Guaíba-enchente, lodo 1,00 x 1,00 x 1,50m 150kg

DECANTAÇÃO,2024 Instalação vidro, galões plásticos, água do lago Guaíba-enchente, lodo 1,00 x 1,00 x 1,50m 150kg

PRÊMIO INCENTIVO À CRIATIVIDADE
Decantação – 2024

Fomos todos impactados em diferentes graus pela recente calamidade das enchentes de maio que se abateram sobre o estado, especialmente em Porto Alegre, e que ainda repercute na cidade e em nós.
Para além das mortes, do desamparo e da sensação de impotência, a arte é uma forma de dar significado a um evento tão traumatizante e dar encaminhamentos aos diversos sentimentos que brotam destas águas. Um dos locais mais emblemáticos e mais afetados foi nosso centro histórico. Ali as águas invadiram e criaram cenas surreais. Quando recuaram deixaram cenas de devastação e o lodo.

O tratamento desta água suja de barro e o papel central do DMAE foram marcantes e mostraram a importância de mantermos nossos mananciais de água potável.

A idéia surgiu da união de diversos elementos que povoaram estes dias e ainda estão presentes, de noites mal dormidas, onde algo não nos deixava descansar tranquilos, algo tinha que ser feito, algo tinha que ser dito.

Um dos elementos mais presentes deste o início foram as bombonas de água, quer as embalagens de 20lts , as de 5lts ou os fardos de garrafas em litro, todas foram disputadas ansiosamente principalmente nas primeiras semanas devido a falta d’água e luz.

Pilhas de garrafas formaram-se em diversos locais de doações num movimento de solidariedade que envolveu as comunidades e o país inteiro. Estas pirâmides simbolizaram, de alguma forma, o trabalho de grupo em favor dos atingidos.

O projeto usa este artefato, da embalagem de água, que se tornou icônico e cria uma pirâmide de bombonas d’água. Bombonas de 20 litros formam a base e os galões de 5 litros compõem os demais níveis desta estrutura em forma circular.

O primeiro nível da instalação, mais baixo perto do solo, o conteúdo é da água do lago Guaíba e representa os rios que compõem sua bacia: Jacuí, Sinos, Caí e Gravataí. Os adesivos que normalmente identificam as diversas marcas de origem das águas minerais são substituídos com o nome dos rios.

O segundo, terceiro e quarto níveis tem 15 galões de 5 litros que representam os dias em que a cidade ficou com a área central totalmente inundada, do fechamento até a abertura das comportas do dique da avenida Mauá. Estes galões estarão dispostos em três grupos com 7, 5 e 3 recipientes.

O segundo nível é formado pelos 7 galões contêm o lodo que restou após o recuo das águas. O material foi recolhido da avenida Mauá nas imediações da praça da Alfandega das ruas Caldas Junior e Gen. João Manoel.DECANTAÇÃO 01

O terceiro nível formado por 5 galões contem metade com lodo e parte com água, já decantada e o quarto nível formado por 3 galões contem parte residual do lodo no fundo e água já quase limpa no restante. O quinto e ultimo nível, no topo, repousa um copo de vidro com água já límpida, cheio até a borda.

É como se o próprio tempo se encarregasse de decantar as coisas. Quatro tampos de vidro suportaram os recipientes que compõem a obra, com diâmetros variáveis desde o mais baixo maior, ao mais alto menor. O tampo de 70cm de diâmetro, que contem os 05 galões leva a frase, em adesivo de letras brancas: O TEMPO DECANTA TUDO…

Som ambiental com o barulho de chuva poderá ser acrescentado à obra, desde que seja possível a ligação à um ponto de energia elétrica próximo ao local a ser indicado pela CMPA para exposição, assim como rede de internet de modo que possa ser ligada a caixa de som Alexa, via wifi. A caixa ficará no piso entre as bombonas da base, do primeiro nível.

Assim como o som a iluminação também pode ser agregada à obra, caso possível, um ponto focal poderá ficar focado sobre o copo do ultimo nível. A obra remete a varias questões que ficarão ao cargo do espectador interpretar, conforme a sua história individual de vivencia deste recente trauma. Várias campanhas estão incentivando a compra de produtos de empresas gaúchas para auxiliar na recuperação da economia. Os galões utilizados na obra são da empresa Água da Pedra, de Lajeado, no vale do Taquari, região muito afetada pela catástrofe climática.

A obra busca alinha-se com os 17 ODS – Objetivos de Desenvolvimento Sustentáveis da ONU , em especial: ODS 6-Água Potável e Saneamento, ODS 11-Cidades e comunidades sustentáveis e ODS 13-Ação contra mudança global do clima. [1]


[1] Texto sob responsabilidade do artista.